Experimente correr prendendo a respiração. Não é possível. Quando
respiramos, captamos oxigênio, que é absorvido e transportado pelo
sangue, sendo responsável pela energia produzida pelos nossos músculos.
Mas como respirar é um movimento natural, quando corremos poucos de nós
prestam atenção ou “treinam” a respiração da mesma forma que treinamos
pernas, movimentos e passadas para ter uma corrida mais eficiente. Para o
treinador José Carlos Fernando, o Zeca, diretor Esportivo da Ztrack
Esporte e Saúde, “quanto mais profunda for a respiração mais oxigênio
chega em nossos músculos e estes terão maior condição de realizar seu
trabalho na corrida”. Segundo ele, “ o que vemos de uma forma geral é
que a medida que o organismo como um todo entra em fadiga (final de
prova ou muita intensidade na atividade), o atleta não consegue realizar
o ciclo respiratório de forma eficiente e isso leva a uma diminuição do
ciclo respiratório e compromete a performance”.
O treinador explica que cada corredor se sente mais confortável com um
padrão próprio de respiração, porém este ritmo está diretamente ligado
ao condicionamento físico do indivíduo. “Quanto mais condicionado maior é
o fluxo respiratório e melhor a resposta da ação esportiva”, diz.
Corredora e professora de ioga, Valeria Spakauskas, trouxe para sua
corrida os Pranayamas, técnicas de respiração realizadas durante as
práticas de Ioga. “Inspiro pelo nariz e expiro pela boca, fazendo uma
respiração abdominal, sempre contraindo esse músculo. Me ajuda muito,
inclusive minimizando o cansaço”.
SEM DOR
O treinamento de técnicas de respiração faz toda a diferença na corrida,
mas não apenas na performance, como também na prevenção de lesões.
Um estudo realizado pelos pesquisadores Dennis Bramble e David Carrier,
da Universidade de Utah, publicado pela revista científica Science lá
pelos anos de 1980, concluiu que o maior impacto da corrida no corpo
acontece quando a pisada coincide com o início da expiração. Assim,
podemos entender que se respiramos 2 x 2 (uma inspiração a cada dois
passos, por uma expiração a cada dois passos), um padrão quase que
natural e muito comum entre corredores, significa que soltamos o ar toda
que vez na mesma pisada, ou seja, do mesmo lado. Por exemplo, se
começamos a soltar o ar toda vez que o pé esquerdo toca o chão, o lado
esquerdo do corpo vai continuamente sofrer mais com o impacto causado
pela corrida.
O trabalho dos pesquisadores de Utah mostrou que quando o pé toca o
solo, a força do impacto é igual a duas ou três vezes ao nosso peso
corporal e que quando exalamos o ar, o diafragma e a musculatura ligada a
ele relaxam, criando uma instabilidade corporal, que impacta ainda mais
na hora da pisada, por isso o momento da expiração altera a
estabilidade.
Foi com base nessas informações dos estudos realizados em Utah que o
treinador norte-americano Budd Coates criou um sistema de respiração
para corredores que não só contribui com a melhor performance, como
também – comprovadamente – na prevenção de lesões.
Ao tomar conhecimento da pesquisa de Bramble e Carrier, Coates começou a
testar em seus pró-prios treinos uma respiração ritmada, alternando a
cada expiração o pé que toca o chão. Dessa forma, ele diluiu a impacto
da pisada e da instabilidade causada ao expirar. O estresse desses
movimentos contínuos passaram a ser igualmente compartilhados entre os
dois lados do corpo. Foi assim, que ele não só resolveu uma lesão que
insistia incomodar no lado esquerdo do quadril, como desenvolveu todo o
sistema que deu origem ao seu livro “Running on air, the revolutionary
way to run better”.
O método de Coates basicamente sugere o que podemos chamar de padrão
ritmado de respiração ímpar. Por exemplo, 3 x 2 (uma inspiração a cada 3
passos e duas expira expiração a cada dois passos). Com o padrão ímpar,
o pé que toca o solo na expiração (momento do maior impacto) será
sempre alternado, ora direito, ora o esquerdo.
O corredor paulistano Darci Silva tomou conhecimento do método de Coates
e resolveu testá-lo. “Eu sentia um desconforto num dos joelhos ao
correr, sempre no mesmo. Foi a um ortopedista e ele me disse que havia
uma descompensação entre os dois lados do meu corpo. Passei a treinar
uma respiração 4 x 3 enquanto corrida. As dores sumiram”. Hoje, o
maratonista já incorporou a respiração ímpar, “nem percebo mais”. Dores,
também sumiram.
Assim como na ioga, que sugere uma respiração mais abdominal, o método
do treinador norte-americano também sugere esse tipo de respiração,
“pois quando você inspira, o diafragma se contrai e se move para baixo,
enquanto músculos peitoriais expandem a caixa torácica, aumentando a
capacidade dela, preenchando-a com mais ar, o que obviamente melhora
todo o funcionamento do corpo”.
EXERCÍCIOS PARA TREINAR RESPIRAÇÃO ÍMPAR
Em seu livro, o treinador Budd Coates sugere, num primeiro momento, treinar a respiração abdominal.
Respiração abdominal. Permaneça deitado de costas. Mantenha seus ombros e peitoral parados
Inspire o ar preenchendo todo o abdome (se necessário coloque as mãos na
região para sentir a expansão da barriga).Abaixe, murche a sua barriga
enquanto expira. Inspire e expire tanto pelo nariz e quanto pela boca.
Faça esse exercício durante alguns minutos, por vários dias, até você
perceber que a respiração abdominal já é quase natural para você.
Respiração abdominal e caminhada. Agora que você já está familiarizado com a respiração abdominal, é hora de passar pra uma nova fase.
Comece a fazer pequenas caminhadas concentrando-se em respirar pelo
abdome e executar uma respiração ritmada ímpar. Inicialmente, você pode
experimentar 4 x 3 (uma inspiração a cada 4 passos e uma expiração a
cada 3 passos) ou 3 x 2 (uma inspiração a cada 3 passos e uma expiração a
cada 2 passos).
Faça essas caminhadas com exercícios de respiração ímpar por algumas
semanas. Concentre-se nas pisadas alternadas, veja se realmente o pé que
impacta na expiração é alterado a cada ciclo.
Corrida com ciclo de respiração ímpar. Depois de
algumas semanas de caminhada, comece a utilizar a respiração ímpar em
seus treinos de corrida. Para uma melhor adaptação, comece com treinos
mais curtos. Teste qual o ciclo de respiração é melhor para cada tipo de
treino que você faz: 4 x 3, 3 x 2, 4 x 1 x 1 x 1. Sempre observando a
alternância do lado impactado nas expirações. Aos poucos vá aumentando
as distâncias até que você se sinta confortável para realizar seus
treinos e provas utilizando esse tipo de respiração.
Fonte:
Jornal da Corrida